Locação por curta temporada: o risco trabalhista que síndicos não estão observando.

As locações por curta temporada não têm causado discussões apenas no campo jurídico quanto ao uso de propriedade. Essa modalidade traz à tona uma segunda preocupação – além da segurança quanto à alta rotatividade de pessoas não moradoras nas dependências do condomínio – que deve ser observada por síndicos e administradores: o acúmulo ou desvio de funções de seus colaboradores. É preciso ter atenção e observar os prejuízos futuros que tais práticas podem acarretar às contas condominiais. 


São inúmeras as falas a respeito da prática de locação por curta temporada. Fato é que, cada condomínio precisa levar em consideração suas características e compreender se faz ou não sentido a permissão ou proibição dessa modalidade.


O assunto não é sobre a proibição ou liberação da atuação dessas plataformas. O alerta é com relação ao acúmulo ou desvio das funções dos funcionários estipuladas em contrato trabalhista, como por exemplo, os porteiros. Ainda que não haja uma definição clara de suas atribuições em lei, cada condomínio possui um contrato de trabalho específico com cada profissional, no qual constam seus deveres e carga horária. 


Vale observar que na “Classificação Brasileira de Ocupações”, ou em sua sigla, CBO, a atividade de porteiro está registrada no código 5174‑10, que traz as seguintes observações quanto às suas atribuições:


  • Zelar pela segurança e patrimônio;

  • Controlar fluxo de pessoas;

  • Receber correspondências e hóspedes (quando aplicável);

  • Realizar pequenas manutenções no seu local de trabalho (entende-se espaço físico onde exerce sua função).


E como definir o desvio de função de um porteiro? Há algumas informações que são capazes de nortear síndicos e supervisores. A despeito da prática como “airbnb”, carregar malas, receber hóspedes temporários, controlar o fluxo dessas pessoas, direcioná-las até a unidade, dentre outros, podem, eventualmente, acarretar ações ajuizadas na Justiça do Trabalho. De acordo com o advogado trabalhista, Dr. Charles Moreira, “tudo aquilo que um funcionário faz em termos de atribuições que não correspondem à função para a qual ele foi contratado ou que importe em um esforço intelectual ou físico maior, pode, em tese, no sentido de que há uma possibilidade de se alegar no futuro como acúmulo de função. A justiça não trata especificamente de um artigo que fale ou defina claramente um acúmulo de função, ela o faz nos termos que destaquei anteriormente sobre o esforço intelectual ou físico superior àqueles que ordinariamente se poderia exigir da função”, destaca. 


Em uma segunda fala, Moreira trata especificamente da função de porteiro, “É claro que se um porteiro está ali para uma carga de trabalho que envolva tão somente abrir e fechar portão para moradores e tratar de outros assuntos básicos, como receber correios, distribuir correspondências etc, quando você institui uma rotina de airbnb dentro de um condomínio, onde os porteiros acabam sendo exigidos no sentido de controlar entrada e saída de pessoas estranhas, solicitar cópia de documentos e ajudar no carregamento de malas, isso vai além das atribuições para as quais ele foi contratado. Em tese, potencialmente, como forma de risco, pode ocasionar, no futuro, uma ação por acúmulo de função”, finaliza.


O texto não discute a legalidade do Airbnb ou locação por curta temporada, mas sim os impactos trabalhistas no condomínio. Mesmo que o condomínio permita a locação, não pode transferir responsabilidades extras a funcionários sem respaldo contratual ou remuneratório, sob risco de acúmulo ou desvio de função.